terça-feira, 14 de setembro de 2010

Balanço crítico à atual gestão do CeUPES (escrito por parte de sua diretoria)

Adoraria poder assinar um balanço menos contundente. Mas, nas circunstâncias atuais, tenho de dizer que fomos até condescendentes demais.


A estrada que ficou para trás e a estrada que ainda temos pela frente


“Se há um caminho para o melhor, ele exige um olhar de frente para o pior." (Victor Turner)


Antes de qualquer coisa, esclarecemos que este balanço crítico não expressa a opinião da gestão A estrada vai além do que se vê do Centro Universitário de Pesquisas e Estudos Sociais (CeUPES), o centro acadêmico do curso, mas apenas a de uma parcela de seus diretores, subscritos abaixo.

Sabemos que constituir um grupo numeroso e plural para uma gestão de centro acadêmico não é tarefa fácil. É necessário disposição para o diálogo e o consenso (para dentro e fora da gestão), o que implica a todo momento não só estar disposto a convencer mas também a ser convencido. Implica saber abrir mão de certas vontades individuais ou corporativas para que prevaleça o interesse coletivo. Esse grande desafio, quando encarado verdadeiramente como algo positivo, pode trazer experiências enriquecedoras para todos.

É compreensível que durante a estrada algumas pessoas se decepcionem por um motivo ou outro, com maior ou menor intensidade. Essa decepção pode ser com a própria posição ou com os rumos que a gestão toma. Quando a insatisfação diz respeito aos rumos tomados pelo grupo, é razoável que os insatisfeitos disputem esse rumo, uma vez que o percebem incoerente com aquilo que o próprio grupo defendia anteriormente.

Os diretores do CeUPES que assinam este texto compartilham de algumas insatisfações e têm, ao longo desta gestão, disputado os seus rumos, da maneira como lhes tem sido possível. Acreditamos que um balanço sério e honesto da gestão a ser apresentado aos estudantes do curso só pode ser feito a partir de nossa carta-programa e dos compromissos que levaram A estrada vai além do que se vê a ser eleita pela maioria dos estudantes, nos dando assim a legitimidade que sempre reivindicamos. Para nós, no entanto, essa legitimidade não é um cheque em branco, mas um compromisso calcado em bases bastante objetivas e de conhecimento público.

Muito do que consta dessas bases objetivas não foi alcançado e nós não podemos nos furtar da autocrítica, afinal só identificando e reconhecendo os erros cometidos e os motivos pelos quais eles ocorreram é que podemos amadurecer o nosso projeto coletivo e reorientá-lo naquilo em que ele estiver equivocado. Não podemos aceitar como natural que se abra um abismo entre o discurso de campanha e a prática enquanto gestão.

Defendemos a carta-programa que nos elegeu quando ela diz que é preciso “construir não apenas para, mas com todos os estudantes”. Apesar de ter sido um evento relativamente bem-sucedido, a Semana de Ciências Sociais (SeCS), por exemplo, foi construída de modo fechado, inclusive no que diz respeito aos próprios membros da gestão. Em nossa carta-programa, dizíamos que queríamos construí-la de forma ampla, “como um espaço no qual a participação de todos é realmente efetiva, tanto na realização quanto na organização da Semana”. O cumprimento do prometido, além de ser uma obrigação, teria evitado que interesses privados se sobrepusessem aos anseios, sequer escutados, do conjunto dos estudantes.

Outra proposta abandonada foi a de “inclusão do período noturno na dinâmica do curso”. Não houve discussão ou atividade alguma voltada a esse público. Ao contrário, mesmo dentro da gestão esse foi o público mais penalizado por sua ausência na dinâmica do movimento estudantil. A superação da “divisão entre estudantes militantes e estudantes de sala de aula”, outro de nossos compromissos, não pode ser concretizado sem que se tenha uma política efetiva para a inclusão dos estudantes do período noturno, em especial daqueles que trabalham ou têm outras responsabilidades fora dos muros do mundo encantado da USP.

Poderíamos tranquilamente listar uma série de outras promessas não-cumpridas, como a manutenção e ampliação de diversas atividades (Café com CeUPES, grupos de trabalho e discussão temáticos, as semanas temáticas, com exceção da Semana de Mulheres, que aconteceu e contou com abertura e diversidade consideráveis) e a política de comunicação, em que os estudantes não só receberiam as informações, mas também as produziriam. A única tentativa de produção coletiva de alguma coisa foi tirada a contragosto na única assembléia ocorrida neste ano no curso, a saber, um boletim a ser elaborado em uma comissão editorial aberta. Até hoje, embora textos tenham sido entregues, nada foi publicado. Sem contar o questionável processo de eleição para representantes discentes (RDs).

Nossa crítica, entretanto, não se pauta de forma irresponsável e irrestrita, ao que sabemos reconhecer avanços conquistados em determinados espaços, como o Escritório Piloto, que se tornou o NAE (Núcleo de Apoio à Extensão). Ele sugere uma maneira interessante de trabalhar com a inserção do cientista social na sociedade, a partir de uma visão de mundo pautada pela troca horizontal, e não a serviço de interesses unilaterais do mercado. Acreditamos, no entanto, que grande parte dos seus avanços se deve à postura de independência organizacional com relação à gestão como um todo.

Os compromissos que firmamos estão todos de acordo com a nossa concepção de movimento estudantil e aquilo que de fato esperamos de uma gestão de centro acadêmico. A atuação da gestão é o que tem destoado, e isso não podemos aceitar calados, pois assim estaríamos sendo cúmplices. É justamente por discordar do balanço oficial da atual gestão que tornamos públicas as nossas divergências e o caráter heterogêneo da composição da gestão A estrada vai além do que se vê.

Não temos aqui o interesse de lavar roupa suja ou desconstruir a unidade dos setores progressistas e consequentes do movimento estudantil, mas em nosso entendimento a gestão avançou muito pouco na concretização de suas propostas, e isso não pode ser escondido dos estudantes, em especial daqueles que, por estarem no primeiro ano, desconhecem o processo e o compromisso político que nos elegeram.

A defesa de um movimento estudantil verdadeiramente amplo e democrático foi deixada de lado e substituída por um modelo que consolida um distanciamento entre centro acadêmico e estudantes, em que a relação entre estes se dá de forma vertical, uma vez que se pratica a concepção de que os militantes sabem o caminho que deve ser trilhado pelos demais estudantes. Não entendemos que estar próximo aos estudantes signifique apenas passar recados em salas ou por meios digitais, mas sim a construção de espaços em que os estudantes não sejam apenas receptores de informação, mas participem da formulação conjunta das atividades.

Durante a estrada, abrimos mão de muitas coisas por aceitar a derrota nas discussões internas, pois sabemos que democracia não é apenas uma palavra bonita para ser utilizada quando se tem a certeza da vitória. Opiniões diversas ao longo desta gestão foram tratadas como bobagem (em manifestações literais), desconfiança ou interesses direcionados de grupos políticos (ainda que parte de nós não seja de corrente política nenhuma). Esse tipo de posicionamento nos torna bastante desesperançosos com relação à atual gestão e seguros de que a inviabilização do cumprimento de nossas propostas se deve em grande medida à falta de vontade política nesse sentido por parte da parcela majoritária da gestão.

Essa parcela majoritária já iniciou seu processo de formação de chapa para as próximas eleições e tem como público-alvo prioritário os estudantes do primeiro ano (repetindo a tática dos anos anteriores). Entendemos que é fundamental agregar esses estudantes dentro dos debates políticos que se dão em nosso curso, mas precisamos fazê-lo de forma contínua, para que a aproximação com o centro acadêmico não se dê apenas durante os preparativos para as eleições, mas durante todo o período de gestão. Precisamos ser democráticos não apenas na forma e no discurso, mas sobretudo nas nossas ações cotidianas.

Por fim, esclarecemos que não estamos rompendo com a atual gestão, por estarmos certos de que a defesa de nosso programa é a forma mais responsável e consequente de defender aqueles que confiaram em nós e em nossas propostas. Seguiremos lutando para que “todos os estudantes tenham o direito de expor sua opinião” em espaços abertos promovidos pelo centro acadêmico, sejam eles assembléias, plenárias, reuniões da entidade etc.

É importante que você, estudante de Ciências Sociais da USP, saiba que, para nós, as propostas da chapa A estrada vai além do que se vê nunca foram da boca para fora.

Assinam: Erika Ferreira de Lima, Fernanda Ortega, Gabriel Neves, Maraiza Adami e Max Gimenes

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