quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Promessa para 2009

Aos que dedicam o seu precioso tempo lendo o que aqui escrevo eu agradeço. Mas não só, eu também faço uma promessa: publicarei aqui semanalmente algum texto, ainda que não seja meu, mas com o qual eu concorde ou ache que mereça ser lido por algum motivo.

Continuem visitando este espaço. Ver que há leitores é, certamente, algo que me faz indescritivelmente feliz. E, em tempo (será?), feliz ano novo!

Beijos e abraços,
O blogueiro

Ofensiva israelense em Gaza

Paz sem voz é medo

Muita gente se pergunta por que há tanto tempo esse povo (entenda-se árabes e israelenses) brigam uns contra os outros. E esse é de fato um questionamento-chave, é o ponto de partida para que seja possível decifrar um conflito de raízes tão antigas e profundas.

Após duas semanas de conflito, que teve início em 27 de dezembro, contabiliza-se oficialmente 784 mortos do lado palestino, em sua grande maioria civis e incluindo na conta mulheres e crianças. Do lado israelense, as baixas somam 13. Sim, cerca de 60 vezes menos. Logo, é importante que chamemos desde o início o litígio de massacre, e não de “guerra”. Parece mais adequado ante a falta de paridade das forças e pelo fato de a incursão militar e os bombardeios serem praticados por apenas um dos lados.

Mas o Hamas não lança foguetes contra Israel? Não são terroristas malvados? Não se aproveitam dos civis inocentes utilizando-os como escudos para se defender dos ataques israelenses? Voltemos às raízes mencionadas no primeiro parágrafo.

É necessário entender o surgimento do Estado de Israel, ainda mais em tempos como o atual, em que jornalistas ignorantes ou mal-intencionados insistem em comparações esdrúxulas. Houve quem tentou usar exemplo com o Brasil no lugar de Israel e também quem pedisse para imaginarmos que Israel fosse a Argentina e Gaza, o Uruguai. Isso seria para facilitar a compreensão. Nada mais falso, as suposições citadas acima e veiculadas por grandes meios de comunicação só nos afastam de uma questão fundamental.

Na época dos regimes nazi-fascistas, houve o Holocausto – matança que deixou cerca de 6 milhões de judeus mortos. Porém, com o fim da Segunda Guerra Mundial e a vitória dos aliados, as perseguições cessaram. Nesse cenário, ganhou força o Sionismo, movimento nacionalista judaico que defendia a criação de um Estado que abrigasse os judeus na região próxima de Sion, nos arredores de Jerusalém.

Em 1947, uma resolução da ONU determinou a criação do Estado de Israel na região onde hoje ele está localizado e que à época era ocupado por árabes. A área engloba Jerusalém, considerada santa para judeus e muçulmanos e que passaria à condição de objeto de disputas. A ONU também decidiu pela criação de um Estado Palestino, o que nunca ocorreu e o que nunca pareceu incomodar muito os governantes do Ocidente.

Da mesma forma que é justo pensar que os judeus de Israel já estão fartos com a histórica perseguição que seu povo sofreu, também é absolutamente compreensível que palestinos e árabes em geral tenham oferecido resistência ao reconhecimento do Estado israelense, criado na região por demanda externa (não havia uma movimento de judeus ali reivindicando um Estado) em uma conjuntura que precedeu a famigerada Guerra Fria, na qual Israel funcionaria como aliado importante do EUA. Quem lá vivia anteriormente foi desalojado. Após as ofensivas contra vizinhos, os israelenses ainda aumentaram o tamanho original de seu território, agravando a situação, o que precisa ser revertido para ser possível o início de uma negociação séria.

Para comparar usando a América Latina como exemplo, como querem certos articulistas da grande imprensa, seria mais fácil pensar em índios e portugueses. Que tal? A julgar pela ofensiva de Israel em Gaza, os objetivos se assemelham: subjugar e, na impossibilidade disso, dizimar o outro povo, chamado de “não-civilizado” para atenuar o peso de tantos cadáveres na consciência.

Certo, voltemos então ao Hamas. Esse agrupamento político-religioso ganhou a última eleição palestina. Portanto, trata-se de um governo eleito democraticamente e, como expressão do desejo do povo palestino, deve ser respeitado. As práticas do Hamas, se comparadas às dos governos estadunidense e israelense, tornam-se até angelicais. É mais lógico atribuir o rótulo de terrorista ao Partido Republicano dos EUA ou aos partidos da coalizão que governa Israel, sem dúvida alguma.

É possível paz com lançamento de foguetes pelo Hamas? Não. Mas o que causou essa reação? O controle da fronteira e o bloqueio à entrada de alimentos, remédios e energia em Gaza. Independentemente de qual das duas ações pareça mais assustadora, a segunda resulta em mais mortes e danos. Há relatos de palestinos mortos até de frio. O que evidencia que, ao contrário do que dizem alguns “analistas”, a trégua que vigorava até pouco tempo atrás não foi rompida pelo Hamas unilateralmente, ela já havia sido desrespeitada também por Israel.

Até o momento, escolas e a Universidade Islâmica de Gaza foram bombardeadas, o que é condenável até por leis de guerra. O governo de Israel quer destruir o Hamas, como se o partido laico – e absolutamente corrupto e ineficiente – Fatah fosse a solução. O fracasso dessa força moderada na busca por melhorar a condição palestina é justamente um dos motivos que levaram esse povo a radicalizar. Tentar combatê-los como tem sido feito leva a população civil da Palestina a se solidarizar com seus líderes e a protegê-los. Nada mais natural para um povo que está apostando suas últimas fichas.

E qual tem sido a reação pelo mundo afora? As notícias, apesar da proibição da imprensa em Gaza (atitude suspeita, não?), tem chegado aos quatro cantos do mundo. O presidente hiperativo da França, Nicholas Sarkozy, tentou articular com seu colega, o ditador líbio Muamar Kadafi, uma proposta de cessar-fogo. A dupla parece afinada, mas o projeto não emplacou.

Outro presidente a se destacar foi o impulsivo Hugo Chávez, que expulsou o embaixador de Israel e mais alguns membros da diplomacia israelense em represália à ofensiva sangrenta. Há quem veja exagero na atitude do mandatário venezuelano, mas exagerada é na verdade a passividade com a qual assistem ao massacre certos presidentes. Pressão diplomática como medida contra quase oito centenas de mortes (por enquanto) e contra crimes de guerra? Parece bastante razoável, e Chávez foi o único a fazê-lo, tornando-se sensação entre árabes e pacifistas. Boicote econômico seria outra arma com grande potencial.

Milhares de manifestantes também têm tomado as ruas das principais cidades ao redor do globo, inclusive do Brasil. Israel, com sua ação violenta, corre o rico de reavivar o anti-semitismo mundo afora. Combatem extremistas árabes utilizando como meio o extremismo à sua maneira. A intolerância é, sem dúvida, o principal obstáculo para a paz. Sem reconhecimento da legitimidade do Hamas, é improvável a aceitação por parte deste do Estado de Israel – que é uma realidade e cuja existência não pode ser ignorada.

O fato é que o atual governo de Israel, com o apoio dos EUA, quer enfraquecer os palestinos e torná-los perdedores conformados. Que pensem várias vezes antes de se levantarem contra o Império e seus representantes. Essa é a paz que atualmente busca Israel. Mas a isso se dá outro nome. Paz sem voz não é paz, é medo. E medo os palestinos não têm, irão certamente até o fim com a resistência. Até a última gota de sangue.

Este texto foi publicado originalmente no Correio da Cidadania e, posteriormente, em O Diplomático.
Disponível em:
http://www.correiocidadania.com.br/content/view/2805/
e
http://odiplomatico.blogspot.com/2009/01/por-max-gimenes-muita-gente-se-pergunta.html

Vem aí um novo partido...

PPL: um novo partido de esquerda?

Reunido no último fim de semana no centro da cidade de São Paulo, o Comitê Central do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) deliberou a respeito do futuro da organização, que, após mais de 30 anos, enfim deixa o PMDB. Ao contrário do que se chegou a cogitar (suposição razoável, aliás, haja vista o exacerbado lulismo que ultimamente tem caracterizado o movimento), não houve proposta de entrada no PT, mas sim o encaminhamento para a busca das 500 mil assinaturas necessárias para a criação de um novo partido até junho de 2009, prazo para que este possa disputar eleições já em 2010.

Chamado Partido Pátria Livre (PPL), referência ao Hino da Independência, a agremiação seria uma forma, segundo seus idealizadores, de avançar na construção da uma frente nacional-desenvolvimentista, cujo líder é o presidente Lula e cujos partidos de sustentação seriam mesmo PT e PMDB, juntamente com o restante da base do governo federal. Criando uma nova legenda, o MR-8 pensa poder conseguir mais espaço e ter mais peso nas negociações políticas, em vez de se tornar mais uma corrente interna no PT.

Contra a entrada no Partido dos Trabalhadores pesa também a forma como este costumava se organizar. Uma das coisas mais importantes introduzidas pelo PT na política brasileira, a democracia interna e a participação ativa da base – embora essas coisas hoje não funcionem bem assim –, não são tão bem vistas pelo MR-8. Estes, de tradição stalinista, consideram essa estrutura, com livre organização interna em correntes e tendências, uma bagunça. Preferem um centralismo democrático em que a direção determina a linha e a base a segue à risca.

Em seu manifesto de lançamento, datado do dia 7 de dezembro, o pretenso partido reafirma seu compromisso com a visão etapista de revolução, apontando ser necessária a aliança com a burguesia nacional não-monopolista para promover a libertação nacional e derrotar os monopólios internacionais. E, assim, ajudar a jogar terra na cova onde se meteram o imperialismo estadunidense e a ideologia neoliberal por ele sustentada.

O PPL surge, sempre de acordo com o seu manifesto de lançamento (intitulado “Carta ao povo brasileiro”, pasmem), como um partido “de esquerda”. Não faltou, é claro, uma alfinetada, ainda que sem referência nominal, naqueles que fazem oposição de esquerda ao governo Lula: PSOL, PSTU e PCB. Há as seguintes colocações: “fora dela [a tal frente] o que existe é o retrocesso” e “os setores que se pretendem à esquerda do governo Lula [têm sido levados] ao vexatório papel de linha auxiliar das viúvas do neoliberalismo encasteladas no PSDB e no DEM”, estes últimos efetivamente citados.

Em um dos cinco princípios que servirão de alicerce para a futura sigla, há o compromisso com um “horizonte socialista”. Se depender do pragmatismo do MR-8, é possível que não haja ser humano para contar história quando chegar tal momento, pois o capitalismo atualmente nos arrasta ao precipício. Para aqueles que imaginam que os “revolucionários” do MR-8 estão rompendo brigados com o partido ao qual ainda pertencem, esqueçam. Sem radicalismos, companheirada. O manifesto é encerrado com um parágrafo que faz média com o PMDB, aquele de José Sarney, Renan Calheiros, Orestes Quércia, entre outras tantas figuras bastante conhecidas pelos brasileiros. Para o MR-8, foi uma “honra” permanecer por lá durante todo esse tempo.

Em recente debate sobre a crise financeira global e também em sua coluna no jornal “Folha de S.Paulo”, Cesar Benjamin – editor da Editora Contraponto e, por acaso, ex-militante do MR-8 – afirmou que as turbulências na economia mundial poderão ter sérios impactos no Brasil. O que pode trazer conseqüências para o jogo político-partidário brasileiro que hoje parecem inimagináveis, como uma aliança entre PT e PSDB, por exemplo, em defesa dos interesses nacionais (o que contaria com o apoio entusiasmado do tal PPL, nacionalista acima de tudo).

A criação desse novo partido, ainda que seja algo de certa forma pouco relevante e que talvez nem sequer se concretize, sinaliza que há mesmo espaço para movimentações e rearranjos. O que está por vir não sabemos, mas as surpresas já começam a aparecer.

Texto publicado originalmente no Correio da Cidadania, em 12 de dezembro de 2008. Disponível em: http://www.correiocidadania.com.br/content/view/2696/9/